A menina
Nós, mulheres, sempre escrevemos. Mas a verdade é que nem sempre nos deram o crédito. Há projetos muito bons de valorizar a literatura feita por mulheres e para mulheres. Naturalmente, sempre são lembradas escritoras jovens que estão lutando para ter seu reconhecimento. Mas e aquelas que foram reconhecidas e estão um pouco esquecidas? Faz tempo que não leio ou escuto nada sobre Lygia Fagundes Telles.
Imortal da Academia Brasileira de Letras, Lygia é uma que sofre da maldição “de”: mesmo tendo escrito muitos livros, é comum referir-se a ela como a primeira esposa de Goffredo da Silva Telles (aliás foi assistindo a um documentário sobre ele que me recordei dela). Aos 94 anos, suas obras são consideradas clássicos da literatura brasileira- e já passou da hora de a reconhecermos também como feminista.
E isso porque tanto “Ciranda de Pedra” quanto “As Meninas” são protagonizadas por mulheres fortes e à frente de suas épocas. Quando a conheci na entrega do prêmio Juca Pato, no Largo São Francisco, escola aonde estudou Direito, ela me disse que não concederia entrevista naquela noite.
– Posso dizer então que eu sempre choro toda vez que leio “A disciplina do amor”?
– Você vai me fazer chorar aqui?
– Só se a senhora me der um beijo e um abraço.
Não apenas ela deu como passou o seu telefone para que pudesse conversar com ela sobre Lia de Melo Schultz, a minha personagem favorita de “As Meninas”. Tanto a leitura como a releitura de Lygia são boas pedidas para pensar e repensar o papel das mulheres na sociedade brasileira. Deixo aqui como sugestão o discurso de posse dela na Academia e o volume sobre ela da Cadernos da Literatura Brasileira, com depoimentos e entrevistas.
É jornalista formada na Cásper e estuda Direito no Mackenzie. Viajou quase o mundo inteiro gastando poucos tostões ouvindo rock and roll até assentar em São Paulo. Cristã, militante dos direitos humanos e dos animais, é feminista e adora uma burocracia.